Excerto

 

 

DOC. 6

 

 

Continuação da narração dos acontecimentos que ocorreram na

vanguarda do Exército do Algarve comandada pelo Tenente Coronel Sebastião Martins Mestre

 

[Discurso de Sebastião Martins Mestre às tropas algarvias do Exército do Sul][1]

 

 

[...]

Vós, meus Soldados, não me negareis que debaixo das ordens do nosso Marechal de campo José Lopes de Sousa, eu, com um punhado de pescadores, fizemos abater o orgulho da Legião do Meio-dia, no lugar de Olhão, tanto na abordagem que lhe demos no mar no dia 17 [sic] de Junho, como na tarde do mesmo dia na ponte de Quelfes; para cada um destes pescadores o inimigo tinha dez vencedores do Marengo, Jena e Friedland, contudo o que não foi morto foi posto em fuga ou [feito] prisioneiro. Vós sois igualmente Algarvios, sois Soldados Generosos que sem mais auxílio do que o vosso valor fizestes afugentar do Algarve o inimigo, e com o mesmo valor e inexplicável generosidade vos oferecestes voluntários para defender a província do Alentejo, e a mesma capital de Lisboa. Pois companheiros, amigos e Irmãos, estes que vamos combater e vencer são os mesmos cobardes que nos fugiram do Algarve. É verdade que os vereis vestidos de Tigres, mas é porque estão salpicados com o sangue dos inocentes e impossibilitados moradores de Beja e Évora, de cuja maldade, se não tomarmos vingança, aquelas mesmas vítimas inocentes, se as não vingais no sepulcro, os seus ossos rechaçarão os nossos com desprezos, estas honradas palavras não vo-las digo como vosso chefe, se não como um Soldado, como um vosso companheiro que aspira a conduzir-vos à glória: ver-me-eis entrar por entre os inimigos desprezando as suas baionetas, e comendo a morte aos bocados.

Aguiar, 15 de Agosto de 1808, à uma hora da tarde.

Sebastião Martins Mestre, Tenente-Coronel.


 

[1]       In Alberto Iria, A Invasão de Junot no Algarve, ed. cit., p. 331 (Doc. 6).

         Este discurso foi pronunciado em Aguiar, antes do Exército do Sul rumar a Alcácer do Sal. Sebastião Martins Mestre, Comandante da vanguarda do dito exército, incentiva os seus soldados com o exemplo dos confrontos que, com poucos meios, venceu em Olhão. Pelos seus feitos à frente do exército algarvio para o qual dirigia tais palavras, a Junta Governativa de Beja tinha-o entretanto condecorando com a patente de Tenente-Coronel. Sebastião Martins Mestre, ou a pessoa que fixou o texto, equivocou-se no entanto quando assentou que os dois citados confrontos ocorreram no dia 17 de Junho, e não no dia 18, quando realmente se passaram.

Transcrição e anotações de Edgar Cavaco